O avanço da prévia do índice que mede a inflação oficial brasileira para acima do esperado em julho vai obrigar o Banco Central (BC) a assumir uma postura mais arrojada na elevação da Selic, a taxa básica de juros da economia brasileira, para evitar que o cenário deste ano contamine ainda mais as perspectivas para 2022.
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo – 15 (IPCA-15) foi a 0,72% neste mês, acima da mediana de 0,65% estimada pelo mercado financeiro. Este foi o maior registro para o mês desde 2004 e leva o acumulado nos últimos 12 meses para 8,59%.
O resultado divulgado na sexta-feira, 23, foi o último levantamento sobre o IPCA antes da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), agendada para os dias 3 e 4 de agosto, para definir o futuro dos juros. Em junho, o colegiado elevou a Selic para 4,25% ao ano, uma alta de 0,75 ponto percentual — o terceiro movimento na mesma magnitude —, e sinalizou que deve repetir a dose no mês que vem.
A surpresa negativa com a inflação, no entanto, leva analistas a enxergarem espaço para acelerar a trajetória de alta com o acréscimo de 1 ponto percentual em agosto e finalizar o ano na casa dos 7%.”O Banco Central precisa reagir de forma tempestiva e rápida, e isso significa o aumento acima do esperado”, afirma Tatiana Ribeiro, economista da XP Investimentos. A entidade estima mais duas altas seguidas de 1 ponto percentual e uma de 0,50 ponto, deixando a Selic a 6,75% até o ano que vem.
A energia elétrica assumiu o papel de principal vilã da inflação com o encarecimento da taxa extra da fatura em meio à pior crise hídrica dos últimos 90 anos. O índice também é pressionado pelo encarecimento das commodities, sobretudo os combustíveis e os alimentos.
O presidente da autoridade monetária nacional, Roberto Campos Neto, insiste em dizer que o aumento da inflação é temporário, apesar de admitir que a pressão já se disseminou por parte da cadeia econômica. A falta de um posicionamento mais duro arrisca esticar o atual cenário para 2022. O BC já abandonou a perspectiva de fechar este ano dentro da meta e projeta que o IPCA chegue a 5,8% em dezembro.
Para 2022, o Conselho Monetário Nacional fixou centro de 3,5%, com margem entre 2% e 5%. “Não é simples trazer o IPCA de quase 9% acumulado em 12 meses para 3,5%”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que prevê a Selic encerrar 2021 a 7,25%. “Teremos dificuldade com o carregamento tão forte da inflação em 2021 para o ano seguinte, por isso é preciso um esforço muito grande do Banco Central.”
O cenário inflacionário de 2022 ainda deve ser impactado pela forte volatilidade do câmbio em meio ao processo eleitoral. A retomada do setor de serviços a partir do avanço da imunização da população contra o novo coronavírus também é apontada como ponto de pressão na variação dos preços.
Por outro lado, a normalização da cadeia produtiva, após a falta de insumos que afetou a indústria em 2020 e início deste ano, e a acomodação da oferta e procura — ambos fenômenos da crise sanitária sobre a economia — tendem a tirar parte da força do IPCA. “Temos muitas incertezas pairando no ar, e em 2022 ainda estaremos dentro de um ambiente de pandemia. O Banco Central tem de agir rápido e não tentar jogar a sujeira para baixo do tapete como fez no início deste ano”, diz Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos. Apesar de afirmar que tecnicamente o BC deve somar mais 1 ponto percentual na Selic, Simone diz que a decisão se manterá em 0,75 na próxima reunião. “É uma questão de perspectiva. Aumentar 1 ponto agora pode gerar desconforto por parecer que o Banco Central está admitindo que a situação está crítica. Seria o ideal, mas algumas vezes é melhor ir dosando aos poucos”, diz ela, que estima a Selic a 7% no fim deste ano.
A deterioração do cenário inflacionário é observada há meses pelo mercado financeiro. O Boletim Focus, relatório do Banco Central que reúne a perspectiva para a economia brasileira, revisou para cima a perspectiva para o IPCA em 2021 pela 15ª vez seguida, passando a estimativa para 6,31%. Para 2022, a projeção se manteve em 3,75%.
O movimento indica a expectativa de queda do índice a partir de agosto com a acomodação do preço das commodities e sem novos aumentos na taxa extra da energia elétrica. Para os analistas, no entanto, outros fatores podem dificultar essa trajetória de queda. “Mesmo sem a pressão da energia, resquícios do aumento dos alimentos e o câmbio podem impactar”, afirma Vale, da MB. A opinião é compartilhada com Tatiana, da XP. “Em agosto não teremos mais reajustes na energia, mas a visão ainda é de inflação pressionada”, completa.
Jovem Pan