Cientistas da Embrapa verificaram que o fungo Clonostachys rosea se mostrou um eficaz agente de controle do mofo-branco (Sclerotinia sclerotiorum) e da mosca-branca (Bemisia tabaci biótipo B), ambos considerados grandes problemas fitossanitários para várias culturas, como soja, algodão, feijão, tomate, batata, canola e girassol. Além disso, os pesquisadores conseguiram obter um meio de reprodução barato do microrganismo benéfico, abrindo perspectivas de produção em larga escala de um futuro bioinsumo agrícola.
Células do fungo foram produzidas por uma técnica eficiente e de baixo custo, chamada de fermentação líquida submersa. Dessa forma, é possível obter uma produção em larga escala, em biorreatores automatizados.
Nos ensaios em laboratório, o fungo parasitou 100% de estruturas (escleródios) do organismo causador do mofo-branco e causou mais de 70% de mortalidade em ninfas da mosca-branca.
De acordo com o pesquisador da Embrapa Meio Ambiente Wagner Bettiol, o fungo apresenta múltiplas funções ecológicas que beneficiam inúmeras espécies vegetais. “Esse microrganismo é um excelente agente de biocontrole, sendo micoparasita de um grande número de fungos fitopatogênicos [causadores de doenças em plantas]”, relata o pesquisador.
Entretanto, devido às dificuldades de sua produção em larga escala usando substratos sólidos, seu uso comercial ainda é muito limitado. Até o momento, existem apenas alguns produtos comerciais à base de Clonostachys rosea disponíveis
em todo o mundo, como as marcas Vectorite e Endofine no Canadá, e Kamoi no Brasil. A produção industrial é realizada em substratos sólidos constituídos por grãos de cereais, cevada ou aveia, na América do Norte, e por grãos de arroz, aqui.
“Até o presente momento, não há registro no mundo de qualquer produto comercial contendo esse fungo que seja de origem de propágulos [células] ativos obtidos pela fermentação líquida submersa”, destaca Bettiol.
Perdas econômicas
Juntos, o mofo-branco e a mosca-branca são responsáveis por grandes prejuízos nas lavouras. Somente na soja, o mofo-branco provoca perdas anuais estimadas em até US$ 1,2 bilhão, nos Estados Unidos, e de US$ 1,47 bilhão, no Brasil. Já a pequenina mosca-branca é responsável por danos que somam cerca de US$ 1 bilhão ao ano nas plantações brasileiras.
Em contraste, os processos de cultura submersa oferecem várias vantagens sobre o método tradicional baseado na fermentação em estado sólido, segundo a Embrapa. O meio líquido proporciona um sistema de produção mais econômico e eficiente devido ao menor tempo de cultivo e maiores ganhos econômicos e de produtividade, além da facilidade de escalonamento industrial e maior controle dos parâmetros fermentativos. No estudo publicado na revista Frontiers in Microbiology, os pesquisadores relataram a produção de 1,1 bilhão de conídios por mililitro de meio de cultura, após quatro dias em biorreator.
O pesquisador Gabriel Mascarin, um dos autores do artigo, relata que foi observada, pela primeira vez, a formação de microescleródios desse antagonista em meio líquido.
“Essa estrutura do fungo é importante, pois apresenta maior capacidade de sobrevivência nas condições em que for aplicada e ainda abre a possibilidade de ser utilizada no tratamento de sementes de diversas culturas vegetais”, conta o cientista. “A multiplicação em larga escala dos agentes de biocontrole é um importante fato para alavancar e implementar um programa de controle biológico em larga escala”, destaca Mascarin.
O cientista afirma que o desenvolvimento comercial de biopesticidas fúngicos é criticamente dependente da facilidade de produção em grande escala, e isso requer processos e meios de cultura econômicos para se tornar viável. O processos podem ser: fermentação sólida, líquida ou bifásica.
Ele acredita que essa tecnologia irá colaborar para resolver algumas das limitações para o uso comercial de Clonostachys, que além de ser uma ferramenta a mais no -manejo integrado de diversos problemas fitossanitários, ainda promove o crescimento
das plantas.
Potencial do fungo
Uma vez que Clonostachys rosea é um excelente micoparasita de fungos patogênicos às plantas, seria de interesse desenvolver um propágulo mais resiliente, a exemplo do microescleródio que é um tipo de estrutura em repouso, para ser aplicado diretamente no solo onde este fungo pode sobreviver, se alimentando de matéria orgânica em decomposição, além de suprimir o desenvolvimento de outros fungos fitopatogênicos.
Os resultados sugerem que os microescleródios podem ser incorporados na forma de grânulos secos como uma nova estratégia de liberação mais direcionada ao controle de fungos fitopatogênicos habitantes do solo, como o Sclerotinia sclerotiorum e Botrytis cinerea, afirma Bettiol.
Conforme Mascarin, o seu potencial como agente de controle biológico tem recebido grande atenção devido ao seu amplo espectro de hospedeiros-alvo, como fitopatógenos e insetos-praga. A sua versatilidade é atribuída à ativação de múltiplos mecanismos, como enzimas de degradação da parede celular de outros fungos, produção de metabólitos secundários com ação antifúngica e, ainda, indução de sistemas de defesa da planta. Além disso, seus efeitos também foram observados em outros insetos-pragas, como a broca-do-café, cigarrinhas, mosca-do-repolho e mosca- das-frutas.
“Munido de um arsenal enzimático engenhoso, […] o Clonostachys rosea tem ação de biocontrole sobre vários hospedeiros-alvo, incluindo artrópodes, nematoides e fungos fitopatogênicos. Os genomas anotados de diferentes cepas revelam uma infinidade de genes relacionados ao controle biológico que podem desempenhar um papel importante na sua estratégia de antagonismo”, conclui Mascarin.
Canal Rural