Nas últimas semanas, uma onda de protestos de agricultores tomou conta da Holanda. O motivo é a forte reprovação do setor agro ao plano do governo de cortar em 50% as emissões de nitrogênio até 2030. A medida faz parte das regulações ambientais da União Europeia, da qual a Holanda é parte. Para atingir essas metas será preciso reduzir em até 30% a pecuária, diminuir o uso de fertilizantes e até estatizar fazendas. O repúdio ao plano do governo holandês levou agropecuaristas a bloquear estradas, fechar centro de distribuição de supermercados e algumas prateleiras de mercados chegaram a ficar vazias, sem comida fresca disponível.
Eu conversei com um empresário holandês que dirige um centro de distribuição de alimentos lá. Ele disse que a comunicação do governo com os agricultores tem sido ruim, sem senso de urgência para resolver a questão. “Os agricultores ainda não estão satisfeitos com a falta de senso de urgência por parte do governo. O intermediário nomeado não está sendo aceito pela maioria dos agricultores, pois ele não é considerado neutro neste tópico. A outra questão é que eles querem agir agora e não esperar depois das férias (sugestão do governo). Eles querem ser levados a sério. Esses problemas precisam ser resolvidos.”
Diante de tudo isso, não há dúvidas de que a mobilização é legítima já que: 1) há ausência de perspectiva para alguns agricultores continuarem no negócio com a imposição de uma norma ambiental que inviabiliza a produção; 2) a redução esperada é de até 30% no rebanho pecuário do país, com impactos na pecuária leiteira, de suínos e aves; 3) a produção de comida deve ser reduzida com resultado negativo para a Europa, já que a Holanda é um dos principais países agrícolas na região; 4) há falta de diálogo para construção de medidas que conciliem os interesses de preservação e produção entre agricultores e governo.
O presidente da Cooperativa Agropecuária Holambra, Keis Schoenmaker, veio da Holanda para o Brasil há 60 anos e diariamente conversa com produtores de lá. Ele me disse: “Tudo isso dói na alma dessas pessoas e, por isso, essa revolta”. A revolta tem se espalhado entre produtores de diferentes regiões. A agência de notícias independentes PN News publicou no Twitter imagens de protestos na Itália e Polônia. Na visão do cientista político e presidente da CropLife Brasil, Christian Lohbauer, a Europa vai enfrentar problemas crônicos com decisões equivocadas como essas, que podem levar a situações catastróficas.
“Você pensa na agenda do Green Deal que está no parlamento europeu e ela segue a mesma linha. Eu fico realmente chocado com os caminhos que essa agenda está tomando. Só piora e acho a reação dos agricultores europeus e holandeses, em particular , totalmente compreensível. Não acho que vai ter uma solução simples”, declarou Lohbauer. É sabido que na Holanda há registro de contaminação do solo por nitratos e outros componentes, que o país desmatou boa parte do seu território. É óbvio, mas precisa ser dito, que ninguém é contra às práticas de sustentabilidade.
No entanto, há uma clara contradição em relação ao que os próprios governos incentivaram no passado e o que pregam hoje. Mais ainda: querem punir retroativamente um grupo que elegem a dedo como os responsáveis por todo o problema de um país. Nesse caso, os agricultores. A preservação ambiental não pode servir como justificativa para remover o direito de propriedade de gente que vive da atividade há décadas. Há exagero e distorção. Os protestos são legítimos e clamam por diálogo. Com uma guerra acontecendo e os alimentos nas máximas históricas ao redor do mundo, será que podemos nos dar ao luxo de exigir redução na produção de comida?
Jovem Pan