Terra Yanomami vive emergência em saúde pública

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No dia 20 de janeiro de 2023, uma matéria do portal Sumaúma, escrita por Eliane Brum, Ana Maria Machado e Talita Bedinelli, revelou dados desoladores sobre a realidade do povo Yanomami que vive na maior Terra Indígena demarcada do Brasil. A reportagem revela que, durante os 4 anos do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, 570 crianças indígenas com menos de 5 anos morreram por causa evitáveis, por doenças que têm tratamento – um aumento de 29% no território Yanomami em relação aos 4 anos anteriores.

Além das crianças, idosos, e muitos outros indígenas enfrentam uma situação desumana, em um “cenário de catástrofe” como definiu a matéria. E os dados podem ser ainda mais graves, considerando que, durante o governo anterior, as estatísticas não foram devidamente atualizadas.

As imagens são avassaladoras e foram compartilhadas por lideranças indígenas e profissionais de saúde que conseguiram romper o perigoso cerco do garimpo ilegal que se instalou nas terras indígenas. Os indígenas aceitaram compartilhar as fotos, algo raro entre os Yanomami, sinalizando um pedido desesperado de socorro.

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A reportagem teve uma grande repercussão. Imagens nas redes sociais e matérias de outros veículos de comunicação chamaram a atenção para a cruel realidade que os indígenas enfrentam no território entre os estados de Roraima e Amazonas, onde vivem cerca de 30 mil Yanomami. A fome e doenças que têm tratamento fazem suas vítimas entre crianças e idosos que morrem pela falta de tratamento e de assistência, que deveriam ser garantidos pelo poder público.

Com a situação revelada, o Ministério da Saúde declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional, reconhecendo a necessidade de combate à desassistência sanitária dos povos que vivem no território Yanomami. A portaria assinada pela Ministra da Saúde, Nísia Trindade, foi publicada nessa sexta-feira (20), em edição extra do Diário Oficial da União.

A ministra da Saúde, Nisia Trindade, destacou o dramático quadro de desnutrição constatado pelos profissionais de saúde enviados aos territórios indígenas e determinou o envio imediato de cestas básicas, insumos e medicamentos.

Segundo informações do Ministério, além da declaração de emergência, o foi instado um Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE – Yanomami) como mecanismo nacional da gestão coordenada da resposta à emergência no âmbito nacional, que vai ser gerenciado pela Secretaria de Saúde Indígena (SESAI), considerando a tipologia da emergência.

Emergência humanitária

As equipes do Ministério da Saúde estão no Território Yanomami desde o dia 16 de janeiro de 2023, encontrando crianças e idosos em estado grave de saúde, com desnutrição grave, além de casos de malária, infecção respiratória aguda (IRA) e outros agravos.

Técnicos seguem no local avaliando toda a situação e um levantamento completo vai ser apresentado após o retorno da missão, agendado para o dia 25 de janeiro, quarta-feira.

Medidas de emergência e apoio imediato

Desde o dia 20 de janeiro, última sexta-feira, equipes de saúde indígena estão trabalhando em atendimento emergencial. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e vários ministros estiveram no local para acompanhar de perto os esforços emergenciais e a situação dos Yanomami.

Segundo o portal InfoAmazonia, a equipe do Ministério da Saúde conseguiu salvar a vida de um bebê recém-nascido que estava em estado muito grave. Das crianças que estão sob cuidados médicos, oito foram transferidas para hospitais em Boa Vista para tratamento mais avançado, e outras 40 seguem sendo tratadas na reserva.

A BBC Brasil entrevistou o médico tropicalista André Siqueira, do Instituto Nacional de Infectologia da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que contou que esta é a “a pior situação de saúde e humanitária” que ele já viu. O pesquisador do Instituto Socioambiental, Estêvão Benfica concorda. “É uma das maiores tragédias que a gente tem observado nos últimos anos no território brasileiro e acho que agora a questão está um pouco mais compartilhada com a opinião pública”, afirmou à Folha. “A malária teve uma expansão enorme nos últimos anos, e quando você observa os dados históricos das regiões hoje afetadas pelo garimpo, você percebe claramente essa interferência”.

Tragédia anunciada

Segundo dados do Ministério dos Povos Indígenas citados pelo g1, só no ano passado, 99 crianças Yanomami morreram por a problemas de saúde precipitados ou agravados pela presença do garimpo ilegal dentro da reserva.

Como lembra o ClimaInfo, em sua newsletter, “o desastre humanitário que se abateu sobre o Povo Yanomami não aconteceu da noite para o dia. Há décadas, a Terra Yanomami sofre com a invasão de garimpeiros, que levam consigo doenças e violência contra as aldeias indígenas”, problema que se agravou nos últimos quatro anos.

Um levantamento do The Intercept Brasil, publicado em agosto de 2022, revelou que pelo menos 21 pedidos de ajuda foram encaminhados ao governo Bolsonaro pela Hutukara Associação Yanomami. A informação se baseia em ofícios encaminhados a diversos órgãos, como Funai, Ministério Público e Exército, denunciando invasões de garimpeiros ao território indígena.

Neste cenário, Flávio Dino, Ministro da Justiça, determinou a abertura de um inquérito policial para apurar crimes de genocídio e contra o meio ambiente na Terra Yanomami, já que, segundo Dino, Para ele, “há fortes indícios de crime de genocídio” diante dos “sofrimentos criminosos impostos aos Yanomami”.

Um pedido de investigação contra o ex-presidente Bolsonaro e a ex-ministra e atual senadora, Damares Alves, está no MPF. Parlamentares acusam Bolsonaro e Damares de terem contribuído para o agravamento da crise na Terra Yanomami. “Essa política de Estado comandada diretamente pelo ex-mandatário (…) contribuiu de maneira decisiva para a contaminação dos rios [mercúrio] e, consequentemente, resultou nos impactos na alimentação [pesca] e nas condições sanitárias [saúde] dos Povos Tradicionais que vivem e sobrevivem na área onde não deveria haver garimpos, legais ou ilegais”, destaca o documento.

O ex-presidente nega as acusações. Matéria publicada pelo portal UOL, mostra que Bolsonaro classificou a situação das condições de saúde e de vida dos indígenas como “mais uma farsa da esquerda”.

Ciclo Vivo