Como usar vidros na construção civil de forma sustentável e segura

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O que seria da arquitetura contemporânea sem o vidro? Feito a partir de grãos de areia, o material chega a cobrir fachadas inteiras de casas e edifícios de mais de 200 andares e está em constante evolução. “Até os anos 1940, era um artigo de luxo. Poucas casas tinham vidro nas janelas. Ficou acessível com a produção em série”, lembra o arquiteto Fernando Westphal, professor na Universidade Federal de Santa Catarina. “No Brasil, há dez fornos que fabricam 80 toneladas de vidro por dia.”

Com os avanços tecnológicos, o vidro ganhou maiores formatos e melhores desempenhos. “É o produto da construção civil mais versátil. Tem boa resistência e pode ser usado em quase tudo em uma casa: cobertura, divisória, guarda-corpo, degraus de escada, piso de mezanino, móveis e revestimento de parede”, diz Fernando.

No fechamento de ambientes, a transparência do vidro permite a integração com o exterior e a entrada de luz natural. Mas as soluções que o material oferece para projetos de arquitetura vão muito além. Podem proporcionar segurança, privacidade, eficiência energética, conforto térmico e acústico. Existe um tipo certo de vidro para cada objetivo de aplicação, que deve ser corretamente especificado pelo arquiteto.

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Evolução tecnológica

A utilização arquitetônica mais antiga do vidro foi na criação de jardins fechados, estufas e gazebos na Europa. “O objetivo era a entrada de luz solar para alimentar as plantas”, diz Lucien Belmonte, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro). Segundo ele, o combate à tuberculose levou à expansão de seu uso em outras construções para os ambientes serem banhados pelos raios de sol. “Antes o vidro era estirado ou ondulado. A partir da década de 1950, passou a ser superliso. É chamado de float — ou flotado —, que o torna homogêneo”, afirma Lucien.

O país tem quatro grandes indústrias — AGC, Cebrace, Guardian e Vivix —, produzindo vidros de todos os tipos e para os diferentes usos na construção civil, e mais de 500 distribuidores e transformadores de vidro, que fazem o beneficiamento das chapas do material de acordo com a especificação do uso. “Podem ser laminadas, temperadas, de controle solar, acústicas, insuladas para proteção térmica, resistentes ao fogo, de corte boleado ou curvas. A vidraçaria apenas vende a chapa de vidro na medida do projeto que chega pronta na obra”, explica Lucien.

O presidente da Abividro lembra do costume brasileiro de fechar a varanda de apartamentos com vidro para transformá-la em espaço gourmet. Ele alerta para o risco de o espaço ficar desagradável com o calor excessivo se receber muita insolação. “O mesmo acontece quando as construtoras instalam vidros simples nas janelas de prédio residencial”, diz. “A performance é melhor se usar o vidro de controle solar, que recebe superfície metálica para refletir algumas ondas de luz. O ambiente não é aquecido pela radiação solar”, explica.

A tendência do futuro é ter vidros de características mutáveis: de transparente para branco ou preto, segundo Fernando. “Há o vidro eletrocrômico, que muda de cor com o acionamento de botão tipo dimmer, e o fotocromático, que troca de tonalidade conforme a incidência de luz, para controlar a luminosidade no ambiente”, afirma.

Eficiência energética

No Brasil, que tem climas tão diversos e alta intensidade de radiação solar, o vidro tem função importante na arquitetura para proporcionar conforto térmico aos ambientes internos. Especialista em eficiência energética, Fernando Westphal diz que o fechamento de sacada de apartamento com o vidro de controle solar corta até 66% do ganho de calor em relação ao vidro comum, tornando a temperatura do espaço agradável sem precisar ligar o ar-condicionado.

Essa solução pode gerar economia significativa de eletricidade no país, onde, segundo dados da Eletrobras, 16% dos domicílios têm hoje esse tipo de aparelho. “Precisa mudar o conceito na arquitetura para o uso de esquadria com vidro de controle solar, que, sem consumir energia elétrica, proporciona conforto térmico igual ao de ambientes climatizados”, diz ele.

Segundo Fernando, na década de 1970, era impossível imaginar a redução da temperatura interna com o vidro. A partir dos anos 1990, o país começou a produzir o vidro de controle solar, também chamado de vidro refletivo, que hoje é mais utilizado em prédios de escritório. Com tecnologia semelhante à dos óculos de sol, que funcionam como filtro solar, o vidro de controle solar tem longa durabilidade e preço viável”, diz o arquiteto. “O desafio é ampliar o uso residencial, setor no qual é considerado um artigo de luxo. Mas o vidro é um produto barato. Representa 30% do custo de toda a esquadria.”

Luz e privacidade

Os vidros de controle térmico podem ser mais ou menos espelhados para atender aos projetos de arquitetura em estética e funcionalidade. Os mais espelhados diminuem a entrada de luminosidade durante o dia: impedem que quem está fora da casa não veja dentro e permitem, para quem está na casa, enxergar fora. Porém, à noite, ficam escuros para quem está dentro ver o exterior e claros para quem está fora, que pode olhar o que acontece no interior da casa. Por isso é importante calcular corretamente a taxa de reflexão de acordo com a necessidade do local onde será usado.

“Se exagerar, fica feio, além de prejudicar a privacidade à noite porque a casa vira uma vitrine”, explica Fernando. A taxa de reflexão varia de 8% (praticamente incolor) a 25% (bem espelhado). Outra solução é usar vidro texturizado, que tem impressão em alto-relevo. “Era muito empregada nos anos 1970 e 1980 e está voltando agora. Transmite luz e dá privacidade principalmente em espaços mais íntimos, como banheiros.”

Estética e segurança

O vidro de controle solar pode ser temperado ou laminado. “O vidro temperado é recomendado para fachada que recebe muito vento, mas não pode ser usado em janelas da mesma forma que em boxe de banheiro sem sistema de esquadria decente porque não bloqueia a entrada da chuva”, diz Fernando. “O vidro laminado é melhor porque, em caso de quebra, não forma pequenos cacos e dá melhor isolamento acústico.”

O laminado tem uma camada de plástico (PVB) entre duas chapas de vidro prensadas, tipo sanduíche. É um material flexível que absorve a energia do som. “Em janela acústica, o caixilho precisa ter vedação caprichada, e o vidro laminado deve ser mais grosso: de 6 mm a 8 mm de espessura. Por isso custa mais caro. Tem o dobro da massa de uma janela normal”, explica o arquiteto.

O vidro de 4 mm de espessura tem resistência mecânica suficiente para janela pequena, como a de quarto. Quanto maior a abertura do vão, mais grosso deve ser o vidro para evitar sua quebra. No fechamento de sacada, precisa ter 8 mm de espessura para resistir ao vento. Os vidros de segurança ganham maior atenção, principalmente em guarda-corpo de escadas e sacadas, porque precisam ser especificados corretamente.

Isola calor e som

O vidro insulado tem uma câmara de ar entre duas chapas de vidro, o que dá maior isolamento térmico. É usado na porta de refrigerador de supermercado. Instalado em casas que ficam em regiões muito frias ou muito quentes, proporciona maior conforto térmico aos ambientes internos. “Funciona como o isopor que mantém o produto frio ou quente na caixa porque bloqueia a temperatura externa”, explica Fernando. É indicado também para sauna porque não transfere o calor para fora. Já o vidro acústico é feito com duas placas e uma camada de gás no meio para rebater as ondas sonoras. Tem melhor eficácia como isolante de ruídos se tiver boa vedação na montagem das esquadrias. É indicado inclusive para estúdios de gravação.

Siga o manual

Na comemoração do Ano Internacional do Vidro, em 2022, a Abividro lançou um manual para chamar a atenção para as múltiplas possibilidades de uso desse material na construção civil e ensinar a especificá-lo do modo correto. A aplicação do vidro de acordo com as normas da ABNT — Associação Brasileira de Normas Técnicas — garante o melhor desempenho e a maior segurança conforme sua utilização.

“Por exemplo, o vidro que vai acima da cabeça deve ser laminado pela maior resistência. Dependendo da aplicação tem mais ou menos camadas e espessura de 2 mm a 16 mm. Já em claraboia ou outro tipo de cobertura, além de ser mais resistente, precisa ter controle solar — camada refletiva para filtrar a radiação”, diz Lucien. Simples e bem ilustrado, o manual pode ser acessado gratuitamente no portal Vidro Certo. “A ideia é ajudar os profissionais de arquitetura, decoração e engenharia em seus projetos para levar segurança e conforto térmico e acústico aos moradores”, conclui.

Casa & Jardim